sábado, 17 de maio de 2008

O Josué que não estava lá

Josué da Silva era um homem tão magro que há tempos ninguém o via. Sabiam que acordava cedo, antes mesmo do sol nascer e só voltava muito depois dele se pôr. Pai de cinco filhos batizados com a inicial “J”, em sua homenagem, era crente a Deus, mas há anos não pisava em uma igreja. Achava que suas vestes simples não combinavam com a casa do Pai.

De quatro em quatro anos trocava a dentadura, mesmo sem ver uma maçã desde que era criança. Achava uma troca justa e por algumas semanas passeava pela rua sorrindo. Penteava os cabelos que lhe restava com um pente que guardava no bolso, combinava as meias com o lenço, mesmo que ninguém reparasse sua figura. Fazia o mesmo caminho todos os dias e gostava de ouvir músicas em seu rádio à pilha enquanto se preparava para o trabalho.

Era um homem de poucas alegrias, mas nunca reclamava da vida por achar que as coisas deveriam ser assim para todos os outros. Assinava com o polegar a folha de pagamento de todos os meses. Trabalhou trinta anos na mesma fábrica e só quando foi demitido percebeu que seu chefe o chamava de João.
Morreu sem ser velado, acreditando que o mundo acabava nos limites na cidade, que o mar era invenção de andarilhos bêbados e que seus filhos eram o futuro da nação. Só deixou saudades na sua família, que depois de sua morte falavam mais com ele do que em vida.

Assim era o grande Josué da Silva que nunca deixou de ouvir um jogo da seleção, que achava graça daqueles que queriam ir para a cidade grande e nunca conheceu seu pai. Deixou para trás doze netos que por anos achavam que o avô estava escondido, de lado, em algum lugar.

9 comentários:

JLM disse...

É, realmente, depois de ler este belo texto acho q vc deve trocar de faculdade...

(mesmo q ñ pareça, é um elogio, ;)

1 abraço.

.Ná. disse...

Nossa, menina. Adorei seu conto... E saber que muitos Josués existem de verdade.
Beijos

Michele disse...

Oi, Jéssica!

Vim agradecer sua visita e eis que me encanto com seu blog!

Adorei a forma que vc escreve, essa intensidade dos sentimentos simples e essa riqueza de detalhes! Parabéns!

Talvez tenhamos mesmo muitas coisas em comum! hahaha

Vou colocar um link para o seu blog lá no meu canto, ok? Assim posso visitá-la com freqüência! :)

Beijos e boa semana!

julio garcia disse...

Fazia muito tempo que eu não passava por aqui. Mas hoje eu tive a necessidade de ler alguma coisa, então não recorri aos meus inumeros livros que ibernam na estante, recorri ao seu blog.

Muito obrigado por nos presentear com sua inspiração, com sua imaginação..

Um abraço -= Júlio

Lilian Philippi disse...

Tá! Eu simplesmente adorei esse texto. Jéssicaaaaaaaaa.. tu é foda!

Te amo tá. E eu nem estou bebada =P
uahiahiuahi

Ok Ok.

Anônimo disse...

Quantos e quantos Josué's da Silva não vivem por aí, heim!!?!


Rafa.

Felipe disse...

É, se você não tivesse sido a única a apresentar acho que ainda assim você ganhava. Ótimo texto.
;)

Laura Seligman disse...

Jessica, querida
Parabéns pela vitória no Expocom nacional em Curitiba com O Josué que não estava lá!!!!!
Beijão

... disse...

Parabéns.. Belo conto.